A pele que habito

A pele que habito

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Coco Chanel

Sim, sou fã declarada dela, todos sabem...


Todos sabem também que não sou muito do tipo alta-costura, de modo que podem questionar o motivo do meu interesse por essa senhorita eterna, magricela, vestida de menino, com cabelos curtos, cigarro e muita ironia nos lábios.

Bem, Chanel era única!

Órfã de mãe, abandonada pelo pai (pai este que ela esperava religiosamente todos os sábados de sua vida no orfanato) e nascida em uma época em que basicamente existiam três opções para uma mulher: esposa, prostituta ou amante sustentada (algo entre as outras duas coisas). Saiu do orfanato com a irmã para tentar se manter como ajudante de costura e cantando musiquinhas ridículas em cabarés (uma das quais falava sobre um cachorro chamado Coco que lhe rendeu o famoso apelidinho), foi expulsa do tal lugar infame por se recusar a ser prostituta e acabou tendo que se enfiar para viver de favor na casa de um ricaço de vida fútil, que se tornara seu amante.


Durante todo esse período foi subestimada pelos homens que não apreciavam muito o fato dela ser diferente demais, discreta demais, obstinada demais, inteligente demais, coquete de menos...rs...Muito engraçada sua visão absolutamente anárquica dos figurinos espalhafatosos e castradores das mulheres da época: decotes abusivos, espartilhos que tiravam toda liberdade de movimentos e que faziam as damas desmaiarem por não conseguirem respirar, enfeites espalhafatosos, maquiagem de meretriz, chapeis que mais pareciam tendas de circo e todo tipo de mau-gosto e exageros estrambólicos que transformavam a mulher em uma boneca.


Sem dinheiro e muito criativa, Chanel começou a fazer roupas para si a partir das roupas que surrupiava dos armários de seu amante (como se buscasse a partir da liberdade que o homem tinha, descobrir uma nova identidade para si mesma), abdicou de vez do espartilho, adotou a discrição e o preto (minha cor favorita para roupas e a dela também), decidiu que se esconder era muito mais sensual do que se mostrar e, muito significativo também, resolveu montar num cavalo atravessada...rs...Graças a Deus!


Chanel queria apenas trabalhar, poder viver com a dignidade que lhe era intrínseca, mas que não podia exercer na vida porque era mulher e mulheres não podiam trabalhar, especialmente as que não tinham formação nenhuma e oportunidade nenhuma! Ainda assim, diante da total impossibilidade e de ter que se curvar diante de coisas que lhe desagradavam profundamente, continuou sendo ela mesma com teimosia e em absoluto desafio, enfrentando a incompreensão de alguns, o desprezo e o subestimar de seu amante e a aparente desesperança de sua situação, até que um dia alguém a viu!


Boy Chapel foi o amor de sua vida, a única vez em que ela efetivamente quis casar e ter filhos, por ele Chanel teria se contentado alegremente com uma vida normal. Ele percebeu sua genialidade, sua autenticidade, seu talento, a compreendeu, a acolheu nos braços e no coração, fez dela seu grande amor, mas não se casou com ela, trocando-a por uma mulher rica que lhe daria status em seu país, deste modo partiu seu coração e sua últimas esperanças de ter a família que nunca teve, uma vida tranqüila e um amor legítimo.


Chanel decidiu que nunca se casaria!


Pediu a ele um trabalho e ele lhe deu dinheiro para que começasse um negócio em Paris. Chanel começou fazendo chapéus e obteve tanto sucesso, que até hoje seu nome é sinônimo de elegância e bom gosto, conquistou total independência e seu espaço no mundo, tornou-se célebre e pode enfim viver com dignidade, como sempre desejou. Seu estilo era único, marcado por uma individualidade inquestionável, a mensagem era clara: Seja quem você é!


Vivemos nesse país de terceiro mundo machista, onde mulher ainda é bunda e homem ainda é tosco! Essa é uma das coisas que mais me aborrecem na vida...Quando as pessoas vão aprender que sensualidade é pele e não imagem? Que é muito mais interessante ir para a cama com alguém inteiro do que com alguém em partes? Que fazer sexo com uma pessoa é melhor do que com uma coisa?

Chanel para mim é sinônimo de feminilidade verdadeira, onde a força e a delicadeza se mesclam com equilíbrio, onde a elegância e a discrição são combinadas com a beleza e com a sensualidade que já fluem espontaneamente através dos gestos, da curva do pescoço, do sorriso, do toque e da personalidade das pessoas. Aprendemos com ela que a liberdade é a chama que nos permite ser quem somos, essas pessoas únicas que Deus criou um a um. Homem ou mulher, diferentes e iguais diante dEle!


Admiro sua determinação em manter-se digna mesmo nas indignidades, sua esperança inabalável de que um dia a oportunidade surgiria, sua liberdade de ser quem era sem ligar a mínima se seria popular ou não, se seria sedutora ou não, se seria mal interpretada ou não. Penso que algumas pessoas não conseguem ser outra coisa se não elas mesmas, sob pena de nem sempre serem bem quistas, admiradas, amadas ou compreedidas...rs....

Todo mundo conhece o famoso perfume Chanel n.5, quando eu era criança minha avó materna só gostava dele ( era caro, sendo assim ela abria mão de outras coisas para comprá-lo) de modo que cresci na névoa dessa fragrância e do tilintar dos anéis que ela adorava usar, perfume esse do tipo “ame ou odeie”, marcante e adocicado, na real tinha que ter peito para usar e isso minha avó sempre teve, ela própria costureira (aliás minhas duas avós foram costureiras..rs...) que trabalhou a vida inteira para ajudar meu Nono a sustentar os filhos. Aprendeu a ler ouvindo atrás da porta da aula particular que era dada aos seus irmãos (“porque mulher não precisava estudar...”), aprendeu a costurar servindo de babá (“porque mulher não precisava ter ofício, senão ia sustentar marido...”) e teve que fugir de casa para casar com o meu Nono (“porque tinha que casar com libanês para continuar na família...”).

Meu desejo é que a luta dessas pequenas e grandes Chanels da vida, não seja em vão! Que um dia (e temo que só lá no porvir verei isso...), mulheres nunca mais sejam uma coisa a ser desfrutada, mas apenas pessoas a serem amadas e admiradas! Quero ir para cama com um homem que me veja inteira e que me ame como eu sou, não como ele gostaria que eu fosse (e que suporte as rugas que virão, a flacidez que deve chegar a qualquer momento, as estrias dos filhos que foram engendrados pelo amor, e todas as chatices eventuais do dia-a-dia), sem viver na sombra do medo de ser trocada por duas de 20 quando chegar aos 40, aos 50, aos 60! Digo isso com simplicidade, porque sei que a maioria das mulheres que conheço (veja bem, mulheres, não molecas cabeças-ocas de qualquer idade) amam seus homens por inteiro, como eles são...e se sabem que são verdadeiramente amadas e respeitadas, podem acolher também suas limitações, porque ninguém é perfeito!


E viva Chanel, vestidos pretos e cabelos curtos!!! rs