A pele que habito

A pele que habito

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

pequeno poema do vazio

Vazia
Nada e ninguém
Só silêncio e futuro
Frio e escuro
Seguir na frente
Seguir em frente
Passo incerto
Olhos abertos e baços
Segregação
Morto ao entardecer
Medo e encenação
Desconhecido

Quer viver adiante
Quer abrir o mundo
Quer abrir as pernas
E fazer fecundo
Quer fazer barulho
Dar sabor e cheiros
Quer dar forma a tudo
E lavar coeiros
Vida cheia
Ventre de Baleia
Navegando outro mar
Abrir o peito para respirar
Quer voar
Quer se dar
Quer deitar no ar
Na teia da emoção
E fazer da razão
Garupa de alazão
Vento e areia
Morte da sereia
Não mais ilusão
Quer viver à mão
Dar vazão ao mar
e ao vislumbrar
verdade num olhar
De quem tiver de amar

domingo, 22 de novembro de 2009

Holding

Um grande consenso entre todos os terapeutas de crianças, sejam eles psicanalistas, cognitivistas, humanistas ou de qualquer outra linha de pensamento, é a importância de uma BASE SEGURA no princípio da vida.

Essa base seria oferecida pelo que Winnicott chamou de “mãe suficientemente boa”, o que viria a ser pais ou adultos realmente preocupados em cuidar, acolher e permitir o real desenvolvimento das crianças pelas quais se responsabilizaram. O mais bonito desse conceito é o fato de não recomendar pais perfeitos e super-protetores, mas pais SUFICIENTEMENTE bons, pais que amam, cuidam, estão presentes e que falham de vez em quando, para que a criança possa adquirir aos poucos iniciativa e independência.

Minha mãe conta que na primeira vez em que fui para a escola (lá pelos 3 anos), não chorei, abanei a mãozinha e segui em frente arrastando uma lancheira maior que eu, enquanto ela ao me ver seguindo em frente ficou chorando atrás...rs...Coisas de Danielli, provavelmente eu devia estar apavorada, mas nunca daria o braço a torcer!!

Essa BASE SEGURA seria um ambiente confiável, estável, verdadeiro, onde existem amor e interesse genuínos, dedicação e momentos bons. Dessa experiência positiva adquirimos a confiança necessária para seguir em nosso desenvolvimento nos arriscando em novas experiências, novos lugares, novos aprendizados. Através desse primeiro período saudável formamos uma estrutura egóica forte o suficiente para suportar as intempéries que certamente virão na vida sem nos destruir.

O que dizer então daqueles que nunca tiveram uma BASE SEGURA? Situação essa cada vez mais a regra e cada vez menos a exceção em nossos dias. Sem falar nos extremos (transtornos de conduta, sociopatas, drogadictos, borderlines e tantos outros quadros...), e nos atendo ao que se vê na esfera da normalidade, (entendendo aqui normalidade como adaptação ao meio social) encontramos adultos sofridos, cansados, envelhecidos precocemente, desiludidos, desgastados de tanto buscar na vida aquilo que foi negado na infância e sem a qual não conseguimos seguir em frente: uma base segura.

Na real, nem é tão impossível assim se conquistar isso, bastaria investir em relações saudáveis com pessoas e coisas que nos fazem bem...Naturalmente, essa falha inicial sempre nos machucará um pouco, mas essas “experiências emocionais corretivas” com bons relacionamentos – e aqui não dá para não lembrar do Dr. House e do papel que o Wilson, a Cuddy e o hospital tem na vida dele...rs...- podem aos poucos ir nos preenchendo e suprindo essa necessidade de Holding (na psicanálise é sinônimo de acolhimento, o que o terapeuta deve poder nos dar durante o tratamento) que sempre temos e teremos. Então por que não conseguimos?

Porque nossa matriz de relação amorosa é defeituosa!

Se nossa base inicial foi abusiva, descuidada, agressiva e pouco amorosa é isso que vamos buscar como objeto de amor, é um ciclo neurótico clássico, mais ou menos como um vício, uma obsessão, um verdadeiro radar de destruição! Isso vai acontecer seguidamente até que se compreenda isso e se comece, por iniciativa própria a alterar esse padrão.

Quantas vezes na vida você estragou algo que era bom para você? Quantas vezes se auto-boicotou sem nem aos menos entender o porquê?

Hábitos destrutivos, não cuidar de si próprio, insistir em relações doentias que te fazem sentir uma bosta, tudo isso com uma máscara de cinismo tosca e rachada (sim, porque todo mundo percebe que é falsa) e um sorriso de teimosia tola nos lábios.

Matriz defeituosa!

A boa notícia é que temos escolha SIM.

O início é absolutamente assustador, principalmente porque ter uma base segura nos é desconhecido e no mundo das neuroses é melhor passar a vida inteira num calabouço conhecido, do que sair pela porta e arriscar algo diferente...

Ironicamente ao fugir das mudanças perpetuamos aquilo de que mais temos medo. Se desejamos ardentemente ser amados, nos condenamos ao ostracismo e a uma vida sem relações reais e sem amor, por medo de arriscar, por carregar eternamente a culpa das coisas que destruímos devido aos modelos ruins que nos regiam, não nos perdoamos, não tentamos outra vez, apenas não nos permitimos! Se desejamos ardentemente desenvolver nossos potenciais mais importantes, nos recolhemos na mediocridade e passamos a vida invejando o que outros conseguiram porque não tiveram medo de arriscar, e aí damos a desculpa de que não temos talentos (nos olhando talvez com os olhos baços daqueles que nos negaram uma base segura).

Esse texto não é sobre culpar aqueles que nos negaram o que precisávamos, até porque isso é inútil, é correr atrás do vento com o coração cheio de amargura! Esse texto é sobre assumir a responsabilidade real sobre a nossa vida, aproveitar os sinais que Deus nos dá todos os dias, tomar a iniciativa, fazer escolhas, boas escolhas para as nossas vidas...LUTAR PELAS COISAS QUE QUEREMOS E QUE SABEMOS QUE SERÃO BOAS PARA NÓS...É sobre parar de ser covarde e perder os melhores anos das nossas vidas em idiotices infantis, dando desculpas esfarrapadas para não ter uma vida, chafurdando nesse mal transgeracional que temos o poder (na graça de Deus) de romper!

Meu desejo para mim e para você é uma quebra total com tudo de ruim que já aconteceu no passado, uma decisão profunda e intensa de mudar a direção das coisas, de tomar posse daquilo que Deus nos oferece com todo o amor dEle – UMA VIDA COM SENTIDO cheia do HOLDING que Ele pode oferecer melhor do que qualquer outra pessoa e então, SEM COVARDIAS! As coisas nunca serão fáceis nesse mundo caído, mas podemos viver sem essa nuvem cinza de incompletude e de fracasso que paira nas nossas cabeças todos os dias.

Existe possibilidade de escolha!

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Coco Chanel

Sim, sou fã declarada dela, todos sabem...


Todos sabem também que não sou muito do tipo alta-costura, de modo que podem questionar o motivo do meu interesse por essa senhorita eterna, magricela, vestida de menino, com cabelos curtos, cigarro e muita ironia nos lábios.

Bem, Chanel era única!

Órfã de mãe, abandonada pelo pai (pai este que ela esperava religiosamente todos os sábados de sua vida no orfanato) e nascida em uma época em que basicamente existiam três opções para uma mulher: esposa, prostituta ou amante sustentada (algo entre as outras duas coisas). Saiu do orfanato com a irmã para tentar se manter como ajudante de costura e cantando musiquinhas ridículas em cabarés (uma das quais falava sobre um cachorro chamado Coco que lhe rendeu o famoso apelidinho), foi expulsa do tal lugar infame por se recusar a ser prostituta e acabou tendo que se enfiar para viver de favor na casa de um ricaço de vida fútil, que se tornara seu amante.


Durante todo esse período foi subestimada pelos homens que não apreciavam muito o fato dela ser diferente demais, discreta demais, obstinada demais, inteligente demais, coquete de menos...rs...Muito engraçada sua visão absolutamente anárquica dos figurinos espalhafatosos e castradores das mulheres da época: decotes abusivos, espartilhos que tiravam toda liberdade de movimentos e que faziam as damas desmaiarem por não conseguirem respirar, enfeites espalhafatosos, maquiagem de meretriz, chapeis que mais pareciam tendas de circo e todo tipo de mau-gosto e exageros estrambólicos que transformavam a mulher em uma boneca.


Sem dinheiro e muito criativa, Chanel começou a fazer roupas para si a partir das roupas que surrupiava dos armários de seu amante (como se buscasse a partir da liberdade que o homem tinha, descobrir uma nova identidade para si mesma), abdicou de vez do espartilho, adotou a discrição e o preto (minha cor favorita para roupas e a dela também), decidiu que se esconder era muito mais sensual do que se mostrar e, muito significativo também, resolveu montar num cavalo atravessada...rs...Graças a Deus!


Chanel queria apenas trabalhar, poder viver com a dignidade que lhe era intrínseca, mas que não podia exercer na vida porque era mulher e mulheres não podiam trabalhar, especialmente as que não tinham formação nenhuma e oportunidade nenhuma! Ainda assim, diante da total impossibilidade e de ter que se curvar diante de coisas que lhe desagradavam profundamente, continuou sendo ela mesma com teimosia e em absoluto desafio, enfrentando a incompreensão de alguns, o desprezo e o subestimar de seu amante e a aparente desesperança de sua situação, até que um dia alguém a viu!


Boy Chapel foi o amor de sua vida, a única vez em que ela efetivamente quis casar e ter filhos, por ele Chanel teria se contentado alegremente com uma vida normal. Ele percebeu sua genialidade, sua autenticidade, seu talento, a compreendeu, a acolheu nos braços e no coração, fez dela seu grande amor, mas não se casou com ela, trocando-a por uma mulher rica que lhe daria status em seu país, deste modo partiu seu coração e sua últimas esperanças de ter a família que nunca teve, uma vida tranqüila e um amor legítimo.


Chanel decidiu que nunca se casaria!


Pediu a ele um trabalho e ele lhe deu dinheiro para que começasse um negócio em Paris. Chanel começou fazendo chapéus e obteve tanto sucesso, que até hoje seu nome é sinônimo de elegância e bom gosto, conquistou total independência e seu espaço no mundo, tornou-se célebre e pode enfim viver com dignidade, como sempre desejou. Seu estilo era único, marcado por uma individualidade inquestionável, a mensagem era clara: Seja quem você é!


Vivemos nesse país de terceiro mundo machista, onde mulher ainda é bunda e homem ainda é tosco! Essa é uma das coisas que mais me aborrecem na vida...Quando as pessoas vão aprender que sensualidade é pele e não imagem? Que é muito mais interessante ir para a cama com alguém inteiro do que com alguém em partes? Que fazer sexo com uma pessoa é melhor do que com uma coisa?

Chanel para mim é sinônimo de feminilidade verdadeira, onde a força e a delicadeza se mesclam com equilíbrio, onde a elegância e a discrição são combinadas com a beleza e com a sensualidade que já fluem espontaneamente através dos gestos, da curva do pescoço, do sorriso, do toque e da personalidade das pessoas. Aprendemos com ela que a liberdade é a chama que nos permite ser quem somos, essas pessoas únicas que Deus criou um a um. Homem ou mulher, diferentes e iguais diante dEle!


Admiro sua determinação em manter-se digna mesmo nas indignidades, sua esperança inabalável de que um dia a oportunidade surgiria, sua liberdade de ser quem era sem ligar a mínima se seria popular ou não, se seria sedutora ou não, se seria mal interpretada ou não. Penso que algumas pessoas não conseguem ser outra coisa se não elas mesmas, sob pena de nem sempre serem bem quistas, admiradas, amadas ou compreedidas...rs....

Todo mundo conhece o famoso perfume Chanel n.5, quando eu era criança minha avó materna só gostava dele ( era caro, sendo assim ela abria mão de outras coisas para comprá-lo) de modo que cresci na névoa dessa fragrância e do tilintar dos anéis que ela adorava usar, perfume esse do tipo “ame ou odeie”, marcante e adocicado, na real tinha que ter peito para usar e isso minha avó sempre teve, ela própria costureira (aliás minhas duas avós foram costureiras..rs...) que trabalhou a vida inteira para ajudar meu Nono a sustentar os filhos. Aprendeu a ler ouvindo atrás da porta da aula particular que era dada aos seus irmãos (“porque mulher não precisava estudar...”), aprendeu a costurar servindo de babá (“porque mulher não precisava ter ofício, senão ia sustentar marido...”) e teve que fugir de casa para casar com o meu Nono (“porque tinha que casar com libanês para continuar na família...”).

Meu desejo é que a luta dessas pequenas e grandes Chanels da vida, não seja em vão! Que um dia (e temo que só lá no porvir verei isso...), mulheres nunca mais sejam uma coisa a ser desfrutada, mas apenas pessoas a serem amadas e admiradas! Quero ir para cama com um homem que me veja inteira e que me ame como eu sou, não como ele gostaria que eu fosse (e que suporte as rugas que virão, a flacidez que deve chegar a qualquer momento, as estrias dos filhos que foram engendrados pelo amor, e todas as chatices eventuais do dia-a-dia), sem viver na sombra do medo de ser trocada por duas de 20 quando chegar aos 40, aos 50, aos 60! Digo isso com simplicidade, porque sei que a maioria das mulheres que conheço (veja bem, mulheres, não molecas cabeças-ocas de qualquer idade) amam seus homens por inteiro, como eles são...e se sabem que são verdadeiramente amadas e respeitadas, podem acolher também suas limitações, porque ninguém é perfeito!


E viva Chanel, vestidos pretos e cabelos curtos!!! rs

sábado, 14 de novembro de 2009

Ventos de mudança...

Começou bem devagar, uma brisa leve beijando o rosto e sussurrando em meus ouvidos umas coisinhas à toa, idéias boas, mas meio absurdas e sem muita possibilidade. Aos poucos foi encorpando, virou vento fresco em tarde quente, fazendo as coisas ficarem mais agradáveis, mais fáceis, mais possíveis e tudo que andava tedioso, estagnado, desesperançado passou a se colorir outra vez. Agora as coisas estão indo mais depressa, o vento vai virando tempestade, já sinto as coisas se movendo de lugar, não conseguem mais resistir à força dele, ventania de mudança, de transformação, logo estarei brincando de Dorothy no olho do furacão. A cada dia fico menos apreensiva e mais ansiosa por ver tudo tomar outra forma, de outro jeito, seguindo um outro caminho, o meu caminho!


Levei fama de não saber lidar com estabilidade, e na verdade durante um bom período estive sempre de malas prontas, meio cigana na estrada, sem parada fixa, sem lugar para repousar a cabeça. Nessa jornada aprendi que existe o tempo e o lugar certo para se plantar sementes, para criar raízes e ver florescer, no lugar/tempo errado nada é gerado, pura perda de tempo, ensaios do que seremos um dia. Não fico mais preocupada com essas coisas! Existem momentos em que demoramos muito para decidir, para atuar, para entrar pela porta que devemos entrar, mas quando finalmente entramos é por ter certeza absoluta de que é ali que queremos estar, não por falta de opção, não porque outras coisas não deram certo ou porque temos medo de não encontrar nunca o que buscamos, mas porque sabemos que é AQUELE o nosso caminho. Não acredito em prêmios de consolação ou em resignação, sou transparente demais e idealista demais para isso!

Sempre gostei da figura do vento, seja no real, seja em metáforas, o vento transformador do Espírito que é irresistível e sopra aonde quer, o sopro da vida nas narinas do homem que faz do pó alma vivente, o vento que leva tudo embora como na música melancólica do Renato Russo, o vento que traz você pra mim como na do JQuest...O vento dos espartilhos e do Rhett Butler (um dos meus favoritos nessa minha pequena obsessão por filmes da Guerra de Secessão...rs...) e até os furacões do “Twister” com suas correrias e trilha do Van Halen. Vento, ventania...


Se eu pensar bem, acho que virei psicoterapeuta aos 3 anos de idade, quando a sombra da morte resolveu visitar nossa casa e levou meu irmãozinho, depois minha irmãzinha e toda a vontade de viver da minha mãe. Foi um período rico de amor e pobre de alegria, haviam muitos silêncios e muitas ausências e foi quando aprendi a ler  as emoções alheias, a esconder as minhas e tentar fazer as coisas ficarem o melhor possível, foi também quando decidi cuidar de mim mesma! Podia ter seguido um outro rumo, podia ter escolhido uma profissão totalmente diferente, levar uma vida longe de um contato íntimo com o sofrimento das pessoas, mas a verdade é que nossa história por vezes nos traz dons, dons são para serem usados, e como nada é por acaso nessa nossa viagem, sou o que sou e não quero ser outra coisa...rs..Naturalmente, não fui em quem curou minha mãe, foi Deus, o tempo, o amor do meu pai, minhas irmãs que nasceram, mas me lembro dela ficar um tempão penteando meus cabelos meio absorta, ou me abraçando apertado demais antes de dormir, tantos vazios entre a gente, tantas coisas que não foram ditas e perguntas que não foram respondidas, tantos sentimentos estranhos, mas também tanto carinho...Minha mãe é uma das mulheres mais fortes que conheço e uma das mais frágeis também, e como é bom reconhecer e acolher as fragilidades de quem amamos, porque assim, podemos reconhecer e aceitar também as nossas!

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Cabelo curto e sonhos despedaçados...

Cortei o cabelo e foi como se me livrasse de vinte quilos. Ficou bonito e leve, sinto o vento deslizando amigo em meu pescoço, quando me olho no espelho sinto vontade outra vez que me maquiar e de usar brincos novos, colocar outros tipos de roupa e vestir sapato de salto alto de vez em quando. Sei lá, há muito de terapêutico em um simples corte de cabelo, sou eu mesma como há tanto tempo não conseguia ser, me sinto livre, sincera, aberta...


Tantas coisas na vida são tão mais complicadas do que deveriam ser, demorei tanto para fazer algo que eu desejava mesmo e já fazia tanto tempo, criei tantos dilemas em cima de algo tão pequeno...Que outras coisas venho complicando demais?

Dormi mal essa noite como durmo em quase todas, talvez o calor tenha ajudado dessa vez, mas era algo mais, algo denso, quase palpável ao meu redor, não era sufocante, apenas um pouco pesado demais, como quando estamos em carro cheio, dá para ficar, mas você quer que acabe logo! Percebi que nunca terei a segurança que preciso nas outras pessoas, nas minhas relações, no meu trabalho ou em qualquer coisa dessa vida fluida que vivemos... podemos e devemos ser responsáveis, mas todos nós somos imperfeitos, inseguros e carentes, de modo que, devemos fazer o melhor, mas nenhum de nós pode oferecer garantia completa, seja no que for!

Dar-se conta disso é abrir mão da nossa tentativa vã e infantil de ser independentes. TODOS PRECISAMOS DE ALGUÉM! Seja para segurar nossa mão quando estamos tristes, seja para compartilhar risadas nos momentos felizes roubados dessa nossa existência de luta. Até das minhas gatinhas eu preciso, o que seria de mim sem aquela meiguice peluda, acariciando meu rosto de manhã (5h40 pontualmente) e que me faz acordar feliz e bem humorada todos os dias?

Diz o C.S. Lewis que nossa vida aqui é só uma ante-sala, que os momentos alegres e doces que temos aqui servem apenas para nos deixar com saudades do lar que nos aguarda em outra dimensão, diz também que eles nunca serão freqüentes o suficiente para nos fazer confundir esse lugar com o nosso lugar. Fico pensando que se aqui já temos tantas coisas lindas para admirar e desfrutar, como será então esse nosso lugar? Esse que nos espera um dia?

Um coração pode ser despedaçado tantas vezes e de tantas maneiras, a ponto de não ter mais sequer forma,  e ainda assim, por motivos difíceis de compreender, o mesmo coração se enche de esperança cada vez que um bebê novo nasce ou que alguém descobre que ama alguém. Não há fim da linha para quem acredita na vida! Parece pieguice, parece ingenuidade, mas é o que eu sinto, mesmo quando dói...E eu sei que isso não vem de mim, vem de algo maior, algo que enxerga as coisas como um todo e não em partes.

Lembro do dia em que briguei com minha terapeuta por não agüentar mais ser esse pára-raios emocional que sou, daí ela riu com aquele seu humor tão especial e disse que se não podemos nos livrar de uma coisa, podemos fazer uso dela, e foi quando comecei a afiar minha ferramenta, a aprender a usá-la sem me ferir, ainda não sou tão boa na segunda parte...rs...mas gosto muito mais da primeira!

Sensibilidade, ela nos machuca mais quando olhamos só para o nosso umbigo, na medida em que olhamos mais para o outro ela facilita as coisas, serve como lubrificante, aquece as relações, aproxima, ajuda a descobrirmos o remédio certo. Só dá para usar com certa segurança quando decidimos parar de buscar a felicidade e passar a buscar um motivo maior para as nossas vidas! Cada vez que ouço alguém dizer que tem o direito de ser feliz me dá um arrepio, desse mato vai sair um monte de decisões equivocadas e pessoas feridas. Quando vamos parar de enxergar as pessoas como objetos para nosso uso-fruto? Se não víssemos as pessoas como passatempo, como distração, como algo feito para nos agradar, ou mesmo como algo utilitário, para alcançar nossos fins (nem sempre muito nobres), então nunca nos entediaríamos delas! Pessoas são sujeitos do verbo, nunca objetos...Quando as conhecemos, quando entramos na vida delas e permitimos que elas entrem nas nossas, estamos estabelecendo uma relação entre universos inteiros de sentimentos, pensamentos, valores e realidades. Ninguém existe para a satisfação de ninguém! Para informação, uma das crises mais comuns em consultórios, no que diz respeito às crianças, é o fato dos pais não aceitarem que seus filhos não são o que eles sonharam que fossem, uma injustiça desmedida para os pequenos, muita culpa e frustração para os grandes. Em uma palavra: EGOÍSMO!

Sonho com tardes cor-de-laranja, piqueniques e olhares de paz, sonho com sorrisos sinceros e toques para serem lembrados no "para sempre", sonho com cheiro de shampoo johnsons em cabecinhas bagunceiras e saudáveis, sonho com casa quentinha, comida gostosa e árvores de natal enfeitadas, sonho com família estruturada, marido amoroso, filhos e netos crescendo e virando boa gente, sonho com envelhecer de mãos dadas com alguém também envelhecendo. Sonhos que não sei se vou realizar!  Sonho porém com algo maior e certeiro, algo que já tenho aqui em parte e que um dia terei e verei face-a-face...Tendo isso, nada mais importa, sonhos despedaçados machucam, mas não matam.